A Biblioteca
Kleber Brito
Oito estantes logo à frente, ocupadas de
universos. Onze mesas com quatro cadeiras cada. Um ar cheiroso de jasmim - sei
lá -, ou de alguma fragrância de chá, indecifrável. Sala enorme aquela. Seis
pessoas. À minha direita, um homem, blusa branca, distinto, barbudo,
compenetrado, lendo um calhamaço da grossura do meu pulso. A moça passa em
direção à esquerda, andando por trás de mim. Ali no flanco direito, um rapaz
com um livro gigante, a devorarem-se mutuamente. Garrafinha roxa de água ao seu
lado. Essa garrafinha insinua-se. Veste uma blusa branca também. Não faz o tipo
de atleta, apesar do tênis esportivo. No centro, um senhor de boné azul que lê
um jornal. Folheia. Levanta-se, senta-se. Lê o jornal. Um gole na garrafinha
roxa; risca-se um pouco aqui, risca-se ali. A moça atravessa a sala a passos
lentos e rítmicos. Dois outros jovens à esquerda, um de casaco azul que senta,
no flanco esquerdo de minha visão, levanta, senta, levanta, senta, levanta, faz
que estuda, guarda os livros, recolhe o material e paira. Leva consigo o outro
de camisa cinza, parece estudioso. O senhor folheia mais uma página. Gole na
garrafinha roxa. A moça retorna de seu longo passeio perto da estante, parece
uma rainha branca a cruzar o tabuleiro. Imagino um tabuleiro de xadrez.
Enxadrista, reparo o movimento das peças adversárias. O velho deve ser uma
torre imóvel, ameaçada de captura pela rainha que o cerca: só pode ser isso! As
peças se movem. O homem sério deve ser o rei. O da garrafinha roxa supõe-se que
seja a montaria. Seu jóquei deve ser o colega ao lado. Restou o rei negro-cinza
estudioso, e o bispo que decola e pousa de um lado a outro da sala. Olha para
mim o homem sério. Vai até o da garrafa, indica-lhe algo na anotação feita.
Balbuciam. Preparam um xeque. Lá vem a moça que percorre a sala em passo lebre.
O senhor interpreta a coluna social. Coisas de torre. Os jovens se erguem, cochicham
e se dirigem para a moça, fazem-lhe perguntas, silenciam. Ameaçam a rainha
pálida. O velho vê o cinema, as modelos. Que linda moça aquela da fotografia!
As torres apreciam as moças aprisionadas pelos reis nos castelos. Nem um ruído.
Passos? Ah, era a rainha. Fecha o guarda-chuva. Olha-me, indica o horário de
fechamento. O tempo avança. Preparo minha jogada. O velho indaga-lhe a hora.
Sai, volta e lê agora uma revista. Vejo de longe um título: O Passante.
Cafezinho?! Quero não obrigado. Mais passos. Mais silêncio. Pensamentos?
Levanto-me e vejo na estante um periódico com uma notícia aterradora: Rei morre
afogado. Tenho pressa de escrever isto.
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