sexta-feira, 2 de março de 2012

Análise do Hino do Município de Boqueirão – PB

Bandeira do Município de Boqueirão-PB

1. Letra do Hino de Boqueirão

Boqueirão está feliz
tem amor aos filhos seus.
Tem uma linda bandeira
que o povo concebeu.
Avante, cidade,
pra o futuro que há de vir.
Boqueirão, a cidade das águas,
princesa do Cariri.

Antonio de Oliveira Lêdo
a pedra fundamental lançou.
Deixou toda felicidade
em nossas vidas uma estrela brilhou.

Foi numa linda manhã,
ao resplandecer d' aurora.
Caturité despertou,
Boqueirão se encheu de glória.
Um grande manancial,
que há muito nos alimenta.
O açude Epitácio Pessoa,
obra de grande valor.

O índio Carnoió falou
deixando em nossa memória.
Boqueirão desenvolveu,
então começou nossa história.
Seu nome virou tradição,
um sonho que floresceu.
Nas margens do Paraíba,
onde a cidade nasceu.

Brilha o sol do amanhã,
como raios resplandecentes.
Somos filhos do Brasil,
nossa Pátria, nossa gente.
Somos amigos de fé,
com amor no coração.
Salve a nossa bandeira,
salve Boqueirão.






2. Considerações sobre a letra


Das estrofes

Excetuando-se a segunda estrofe que possui apenas 4 versos, as estrofes do hino possuem 8 versos, o que causa, no início da leitura ou canto, uma quebra no ritmo, na musicalidade poética. Convém destacar que essa estrofe não é um refrão.

Dos versos

Ao analisarmos a letra do hino de Boqueirão, verificamos alguns problemas estruturais e, diante deles, resta-nos tecer algumas considerações: Se a intenção era construir uma letra composta por versos livres ou brancos, o objetivo foi alcançado. Porém, caso a intenção tenha sido a de construir um texto que apresentasse uma rima rica, cheia de musicalidade e que mostrasse uma beleza estética digna da cidade a que se refere, o hino em análise desviou-se drasticamente de seu objetivo.
Inicialmente percebemos rima irregular:

Boqueirão está feliz
por amor aos filhos seus.
Tem uma linda bandeira
que o povo concebeu.
Avante cidade
para o futuro que há de vir.
Boqueirão, a cidade das águas,
princesa do Cariri

Apesar de serem foneticamente próximas, as rimas em destaque nos versos acima não se combinam, visto que o fonema final no 2º verso ser “s” e no 4º ser “u”. O mesmo acontece com o “ir” e o “ri”, nos versos 6 e 8, o primeiro com o “r” mais destacado, e o segundo com “i” aberto.
A segunda estrofe apresenta uma estrutura normal de rima, o verso 2 combina com o 4.
Já na terceira estrofe, observamos:

Foi numa linda manhã,
ao resplandecer d' aurora.
Caturité despertou,
Boqueirão se encheu de glória.
Um grande manancial,
que há muito nos alimenta.
O açude Epitácio Pessoa,
obra de grande valor.

É risível a tentativa de rima na letra de um hino que se pretende musical e poético. Identificamos uma combinação falsa de rima, “ra” com “ria”, conforme destacamos nos versos 2 e 4. Ainda na mesma estrofe, é vergonhosa a combinação de “alimenta” com “valor”, versos 6 e 8.
Nas demais estrofes, não encontramos problemas como os mostrados acima, apenas, como registro destacamos os versos 2 e 4 da terceira estrofe, que possuem, semelhante a primeira estrofe nos versos 2 e 4, uma leve diferença na sonoridade, devido ao acréscimo da letra “s”:

Brilha o sol do amanhã,
como raios resplandecentes.
Somos filhos do Brasil,
nossa Pátria,nossa gente.



Da metrificação
1          2        3      4    5    6    7
Bo/quei/rão /es/tá/ fe/liz
1        2    3         4       5      6       7
por /a/mor/ aos/ fi/lhos/ seus.
1           2    3      4       5      6       7
Tem/ u/ma /lin/da/ ban/dei/ra
1          2     3     4       5      6     7
Que/ o /po/vo/ con/ce/beu.
1      2      3    4     5    
A/van/te,/ ci/da/de,
1             2    3    4            5       6      7
pra o /fu/tu/ro /que há/ de/ vir.
1         2        3       4     5    6     7    8       9
Bo/quei/rão/, a /ci/da/de/ das/ á/guas,
1           2    3      4     5     6   7
Prin/ce/sa/ do/ Ca/ri/ri

1        2     3         4      5    6      7    8
An/to/nio/ de O/li/vei/ra/ Lê/do
1     2     3      4        5      6       7      8       9
a /pe/dra/ fun/da/men/tal/ lan/çou.
1          2        3    4     5    6  7    8  
Dei/xou/ to/da /fe/li/ci/da/de
1          2       3      4     5        6        7      8     9    10     11
Em/ no/ssas/ vi/das/ uma/ es/tre/la /bri/lhou.

1          2      3      4     5      6      7
Foi /nu/ma/ lin/da /ma/nhã,
1          2        3     4    5         6       7
ao /res/plan/de/cer/ d' au/ro/ra.
1       2   3    4    5        6     7
Ca/tu/ri/té/ des/per/tou,
1          2        3        4          5         6      7
Bo/quei/rão /se en/cheu/ de/ gló/ria.
1              2      3      4       5     6   7
Um /gran/de /ma/nan/ci/al,
1                 2       3     4        5  6   7
que há /mui/to /nos/ a/li/men/ta.
1     2    3     4        5    6     7     8     9
O/ a/çu/de E/pi/ta/cio/ Pe/sso/a,
1     2      3       4         5     6     7
o/bra/ de/ gran/de/ va/lor

1      2      3      4         5    6    7    8
O /ín/dio/ Car/noi/ó /fa/lou
1          2        3     4       5      6      7      8
Dei/xan/do/ em/ no/ssa/ me/mó/ria.
1          2        3      4     5        6      7
Bo/quei/rão/ de/sen/vol/veu,
1        2     3      4       5       6      7      8     9
en/tão/ co/me/çou/ no/ssa/ his/to/ria.
1          2        3     4    5       6     7    8
Seu/ no/me/ vi/rou/ tra/di/ção,
1          2        3      4        5      6      7
Um/ so/nho/ que/ flo/res/ceu.
1           2         3         4       5     6  7
Nas/ mar/gens/ do/ Pa/ra/í/ba,
1          2       3    4    5      6       7
On/de a/ ci/da/de/ nas/ceu.

1          2    3    4        5         6      7
Bri/lha/ o/ sol/ do a/ ma/nhã,
1          2      3    4      5       6       7      8
Co/mo/ rai/os/ res/plan/de/cen/tes.
1          2      3     4        5        6     7
So/mos/ fi/lhos/ do/ Bra/sil,
1         2       3     4       5      6       7
No/ssa/ Pá/tria/,no/ssa/ gen/te.
1        2        3   4      5      6     7
So/mos/ a/mi/gos/ de/ fé,
1            2    3        4       5    6    7
Com/ a/mor/ no/ co/ra/ção.
1          2  3     4     5        6       7
Sal/ve/ a/ no/ssa/ ban/dei/ra,
1        2      3       4        5
Sal/ve/ Bo/quei/rão/.

Como podemos observar na escansão feita acima, há uma irregularidade nas sílabas poéticas no decorrer do hino, o que provoca mudança drástica no aspecto rítmico do poema e, consequentemente, alterações na cadência harmônica do mesmo.
Até o 4º verso da primeira estrofe, o ritmo permanece com sete sílabas, passando, a partir do 5º verso - que contém apenas 5 sílabas -, a apresentar modificações consideráveis, ora mudando para 8 sílabas, para 9, e até mesmo 11 sílabas. Na última estrofe, do 3º ao 7º versos verifica-se uma regularidade, contrastando com os versos 2 e 8 que apresentam, respectivamente, 8 e 5 sílabas poéticas. Notadamente, é uma letra de ritmo irregular, e, somando-se esse aspecto aos demais até agora elencados, vem acentuar o empobrecimento lamentável deste texto que se pretende técnico e polido.

Do conteúdo

O bom leitor há de verificar que existem problemas ainda maiores com relação à clareza textual e à coerência na letra do hino em análise.
Sabemos que a coerência é a ligação em conjunto dos elementos formativos de um texto. É o instrumento que o autor vai usar para conseguir dar um sentido completo a ele. Caso não ocorra uma concatenação de idéias entre as frases, elas acabarão por se contradizerem ou por quebrarem uma linha de raciocínio. Havendo isso, podemos afirmar que o mesmo se trata de um texto não coerente.
O que passamos a observar agora é exatamente essa falta de junção entre algumas partes do hino de Boqueirão.
A princípio, logo no início do texto, temos uma idéia dissociada de uma explicação ou motivo decorrente do que se afirma inicialmente “Boqueirão está feliz” (v 1), nos demais versos da primeira estrofe não há uma explicação de o porquê Boqueirão estar feliz. Acresce-se, em seguida, que Boqueirão (elemento elíptico) “tem amor aos filhos seus” e “tem uma linda bandeira” (vs 2 e 3), porém não se esclarece o motivo da felicidade, a não ser que estes sejam os motivos dessa tal felicidade.
Notadamente, o “futuro”, mesmo que todos os seres humanos desejem o contrário, “há de vir” (v 6), não se faz, portanto, necessário esse reforço de idéias, seria o mesmo que ganhar grátis ou ter uma surpresa inesperada.
Na segunda estrofe, entende-se que Antônio de Oliveira Lêdo lançou a pedra fundamental como metáfora da fundação de Boqueirão, mas logo em seguida temos uma ambiguidade marcante, pois ele pode ter deixado (largado, abandonado) a felicidade, ou deixado (dado, posto, colocado, marcado) a felicidade em nossas vidas. Caso seja esta última, teremos “uma estrela brilhou” separado do restante do enunciado, bem como da idéia dessa estrofe. Todavia, como entendemos a estrela ter brilhado em nossas vidas em “Em nossas vidas uma estrela brilhou” (v 4),  o verso “Deixou toda felicidade” parece estar não correspondendo à idéia da estrofe. Haveremos de concordar que o hipérbato nesses versos foi infeliz e compromete o entendimento das idéias apresentadas.
A terceira estrofe é, de longe, a que menos exalta a cidade de Boqueirão, motivo principal do hino. Temos, nesse caso, a indicação que “Foi numa linda manhã, / ao resplandecer d’ aurora” que a Cidade de “Caturité despertou”. Ora, então o hino é de Caturité ou de Boqueirão? Além disso, continua dizendo que, por tal acontecimento, “Boqueirão se encheu de glória”. Com isso, perde-se o foco e a coerência, visto que passa a privilegiar Caturité que desperta como cidade e Boqueirão é mero coadjuvante nesse processo.
Não bastasse essa contradição, a partir do 5º verso da 3ª estrofe, muda-se drasticamente de assunto. Passa a falar do manancial que há muito tempo abastece a cidade e que é de grande valor. Como se pode observar, desvia-se do tema Boqueirão, enaltece Caturité e muda para o Açude Epitácio Pessoa. Mas tudo isso, sem respeitar a coerência entre as idéias. São idéias desconexas, jogadas aleatoriamente sem compor, com as estrofes anteriores, um quadro ilustrativo ou demonstrativo da história ou dos valores da cidade de Boqueirão.


Professor Kleber Brito
Todos os direitos reservados©

5 comentários:

  1. Há tempos este Hino merecia uma análise. Como você citou, existem mudanças drásticas entre os assuntos abordados numa mesma estrofe. Enfim, sempre achei esse Hino meio confuso e acima de tudo, longo demais.

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  2. É facilmente visível que o hino teve uma construção precária. A perfeita dissecação aqui apresentada deixa claro que não se deve entregar o trabalho de um engenheiro a um comerciante, o de um atleta a um técnico em eletrônica, ou seja, existem algumas situações em que amor e boa vontade, infelizmente, não são suficientes.
    A propósito, tenho uma dúvida que, há tempos, quero tentar esclarecer, perguntando ao dissecador que gere este blog, mas a memória, esta mercenária traiçoeira, tem me feito negligenciar: a que se refere as duas datas no brasão da bandeira de Boqueirão - 1959 / 1983 ?

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  3. Meu caro Prof. Kleber,

    Primeiramente, parabenizar-lhe pela clareza com que você expõe sua leitura. Sua análise, sua percepção e iniciativa podem ter sido providenciais! Não seria o caso de socializarmos os impasses percebidos no texto-Hino com a sociedade boqueiraoense, visando, quem sabe, uma discussão a nível de Câmara, a fim de propor as devidas retificações?

    Acredito que o Poder Legislativo tem competência para fazer alterações no texto, desde que embasadas teoricamente (como foi feito) e respaldadas pela referendo popular.

    Poderíamos, em momento oportuno, amadurecer esta ideia, e tonar nosso textualmente mais aceitável.

    À disposição.

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  4. Agradeço aos amigos pelos comentários. Percebo que vocês comungam comigo no tocante à precariedade e necessidade de alterações no hino (ou até mesmo a troca por outro) de nosso município.
    Com relação a sua proposta, Toinho, eu já havia levado essa ideia ao conhecimento de dois vereadores conhecidos, mas pelo que vi não houve, da parte deles, interesse em discutir tais apontamentos (não sei se por desconhecimento, ou por serem subalternos e receberem ordens superiores). Todavia, alheio a tudo isso, me dispus a publicá-lo na internet de modo a demonstrar a tantos quantos este blog alcançar que é preciso discutir isso.
    E, claro, precisamos levar ao conhecimento do povo de Boqueirão e ampliar essa discussão.
    Seu apoio é imprescindível - bem como o de Maxwell e de Mirtes (que são membros da ABES) e, como eu (ou bem mais que eu), se "atrevem" a conhecer um pouco mais de linguagem e interpretação textual.

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  5. Solicito uma analise deste hino.

    Fraternalmente,

    Maxwell Rodrigues de Queiroz .'.


    OH! MINHA QUERIDA SANTANA!
    CIDADE PRÓSPERA QUE AMAMOS
    EMANCIPADA EM 1890
    NO OÁSIS DO OESTE BAIANO

    SEUS PRIMEIROS HABITANTES
    TUPINIQUINS E GUARANIS
    HOMENS FORTES E VIBRANTES
    QUE DEIXARAM SUAS ORIGENS AQUI

    MATAS VERDES, LINDOS CAMPOS
    CONTEMPLADA COM LINDAS NASCENTES
    GRUTAS QUE ESCONDEM SEUS MISTÉRIOS
    COM O BRILHO DO RIO CORRENTE

    TODOS NOSSOS VISITANTES
    ORGULHAM DE NOSSSA CULTURA
    TAMBEM DA PECUÁRIA
    QUANTO DA AGRICULTURA. BIS


    OH! MINHA CIDADE HUMANA!
    HOSPITALEIRA, ORGANIZADA E ATUAL
    REALÇANDO A SUA BELEZA
    BELEZA SEM IGUAL

    OH! CIDADE CHEIA DE ENCANTOS
    QUE DESLUMBRA SUA NOBREZA
    TERRA RICA E SOLO FÉRTIL
    DEMONSTRANDO SUA RIQUEZA


    SALVE! O CORONEL FRANCISCO FLORES,
    QUE DEIXOU A SUA HISTÓRIA
    SALVE! O MESTRE MONSENHOR FÉLIX
    QUE PERMANECE EM NOSSA MEMÓRIA.



    OH! MINHA ESTIMADA SANTANA!
    CIDADE LINDA E BRASILEIRA
    E ALÉM DE SER BAIANA
    É ABENÇOADA POR DEUS E SANTA ANA. BIS

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