Simples assim. E nem tão simples parece. Um dia qualquer de minha lembrança, quando eu passava pela esquina em que fica o açougue, vindo da Rua do Banco do Brasil em direção à Rua do Mercado Público, passa por mim uma menina, uma rosa bailarina. Que estranho lembrar-me disso. Por quê? É tão real aquela bailarina a caminhar em meus pensamentos.
Os dias se passam e minha vida continua vazia, tediosa, amigos, "amigos", trabalho, bebidas, festas, maus conselhos e eu caminho ao abismo. Tinha eu cerca de 25 ou 26 anos, tinha desacreditado da vida, do amor, do que é certo, do que é ter princípios, caráter, sem falar que eu andava muito bravo com Deus. Ora por quê? Pois eu sempre acreditei que valeria a pena o homem se guardar para um amor de verdade. Eu pensava que Deus tinha me reservado um amor de verdade para viver minha vidinha e envelhecer com esse sentimento e morrer e ter um lugar pra sempre e... Havia fracassado em um relacionamento, o primeiro a sério. Pensei por muito tempo que a culpa era minha e de minhas decisões sentimentais, mas não, não era mesmo; a culpa era de Deus. E por que lembrar disso todo santo dia? Ah, a bailarina...
Numa dessas minhas fugas da realidade, convidado por amigos, fui assistir a uma apresentação de arte, teatro, dança, etc. Combinamos, um amigo me apresentou uma cunhada dele, conversamos, olhamos as apresentações e mais uma vez, uma rosa bailarina dança, dança, conduz umas vinte outras bailarininhas rosinhas. Ela era a maior, destacava-se, muito aplaudida. Nunca me esqueço daquela dança, daquele sorriso meio envergonhado.
Volto a minha vida comum, o tempo passa, me envolvo em mil “desvirtuosidades”, lanço-me a precipícios, tento me vingar de Deus, e num dia qualquer em que eu volto de uma festa onde fui tocar guitarra numa banda de forró, em um ônibus vindo de Campina Grande para minha cidade natal, eu simplesmente declino-me a uma depressão, uma crise existencial, um vazio enorme. Vejo agora nitidamente o quão distante eu andei de Deus nos últimos tempos, indiferente ao Seu chamado, aos Seus apelos. Voltei. Voltei ao seio da Igreja de Cristo, a comunhão com minha família, minha mãe, meu pai, meus irmãos e sobrinhos. Comecei a reviver, ou reaprender a caminhar. Porém eu chorava todo dia, sem saber o motivo. Era o monstro da depressão a me incomodar, com o qual lutei bravamente todo dia durante dois anos.
O tempo se passa, claro que passa, e eu me vejo a retomar minha vida, a querer estudar, a mudar de ofício. Invento que quero aprender computação, invento que quero ser o melhor professor de português, e saio inventando.
Primeiro dia da volta às aulas na minha escola, estou eu lá na primeira aula e mais quarenta e poucos alunos do segundo ano. Uns são novatos, outros já conhecidos, o ensino médio nunca esteve tão repleto de caras novas. Foi exatamente neste dia que reencontrei aquela bailarina rosa, com seus adereços rosa, caderno rosa, e sorriso ainda tímido e quase medroso. O ano letivo prosseguia e eu teimava com os alunos sobre a boa escrita; a bailarina já sorria pra mim. Chego em casa, ligo o computador, leio os e-mails, entro num tal de MSN, olho fotos num dito ORKUT, uma "janelinha" sobe, alguém me adiciona, quer conversar, ou melhor teclar, mas de início é só silêncio.
Após algum tempo, estou eu acessando a internet e a janelinha sobe mais uma vez. Quem era? A bailarina, bem pensado. Era ela sim. Conversamos sobre muitas coisas, sobre gosto musical, Djavan, besteiras, solidão, começamos a nos aproximar, nos víamos na escola de outra forma, não era mais uma aluna, era aquela bailarina, encantadora, amável, tão linda...
É, mas eu tinha um medo, receio, temor, ou o que queira chamar. Não queria me envolver com aluna, eu era muito profissional. Que besteira! Ela cuidou em me envolver, me encantar. Descobrimo-nos por coincidência, ou providência, indo no mesmo ônibus de estudantes para Campina Grande. Ela estudava Espanhol e eu Computação, pois eu não queria ficar à noite só em casa ou na rua, remoendo velhas lembranças ou sofrendo a dor da solidão.
E foi assim por muitos dias, conversávamos besteiras naquele ônibus, sempre íamos em cadeiras separadas. Pela manhã, éramos professor e aluna, à noite éramos amigos. Bem pouco tempo depois numa "teclada" pelo MSN, conversamos sobre o que pensávamos um do outro. Nisso, como um relâmpago nos desafiamos a olhar nos olhos um do outro. Eu estava na lan-house de um amigo, sozinho, tomando conta de tudo pra ele; ela estava em casa e saiu de imediato para me encontrar. Dissemos "oi". Foi tão diferente aquilo. Ela se aproximou, cheirosa, linda, tão bailarina, rosa, e eu atônito, ela tão nova, eu professor, ela aluna, frio na barriga, tremor nos pés, que sensação tão boa. "Balinha de iogurte?", "Ah, eu quero!", mãos livres, no rosto, nos cabelos, que cheiro bom, que rosto suave, que boca linda, que lábios, que sabor, que calor, respiração, coração a pulsar forte - como agora quando escrevo. Parece que estou revivendo o momento - tão pouco tempo. Senti-me menino outra vez. "Estou vivo", pensei. Posso realmente amar? Será esta uma chance que Deus está me dando de me redimir Consigo?
Retomamos nossa conversa pela internet, passou-se o tempo, nos despedimos, voltamos à normalidade de nossa vida. E eu me pegava a ver as fotos dela pelo ORKUT. Numa dessas vezes, minha mãe e irmã me viram a delirar, ou "babar", como elas mesmas disseram. Eu passava as horas imaginando se daria certo, calculando, muito meticuloso, eu pensava que poderia fazer um plano de aula perfeito em que protagonizássemos um casal feliz, um amor ideal. Contudo eu temia em me decepcionar.
Semanas mais tarde, mais próximos, mais amigos, mais ansiosos por um novo encontro, fugimos: eu, da faculdade, era umas sete e meia da noite; ela, de seu curso. Encontramos-nos próximo à prefeitura de Campina Grande. Conversamos, nos olhávamos bastante e nos beijamos mais uma vez. Eu parecia um adolescente descobrindo os sentimentos, descobrindo estar vivo, apaixonado. E para nossa infelicidade, o ônibus chega e ela tem que entrar nele, eu fiquei, numa tentativa de disfarçar nosso encontro para os demais, mas "estava na cara" que havia algo muito precioso crescendo entre nós.
Dia após dia, nos víamos na escola, conversávamos, balinhas de iogurte, que parecia representar um beijo para nós. No ônibus, eu sentava à frente dela, e ela a mexer no meu cabelo. Todos viam o quanto ela gostava de mim. E eu já gostava demais daquela bailarina, aluna, amiga.
Numa dessas ideias formidáveis, sua irmã resolve me convidar para dar aulas particulares, com o objetivo de auxiliá-la no vestibular. E todo sábado eu ia a sua casa para dar aulas de redação, gramática, literatura, tomar sorvete, comer salada, etc. No começo eu ia acanhado, mas fui logo me encantando pela família e pelas loucuras de sua mãe. Tornamos-nos cada vez mais próximos, amigos. Mas o medo falou mais alto, a insegurança foi minha inimiga, e não entendo o que me fez dizer a ela, em um dia cinza, que não dava para acontecer nada entre nós. Olhei nos olhos dela, sentados como estávamos no sofá de sua casa, e disse que não tinha como vivermos uma história de amor, éramos tão diferentes. Parti o coração dela com os pedaços do meu. Triste decisão aquela, que me corroeu os ossos e os pensamentos, tirou de ritmo meu pulso. Ficamos amigos, mas nutríamos silenciosamente aquele amor aparentemente impossível.
Alguns meses se passaram...
(Clique para ver a continuação.)
Kleber Brito
Kleber Brito
Ola Kleber sua historia me parece bem real, realmente é? eu tenho história muito parecida com a sua...no caso a "aluna" sou eu! quem dera pudesse gritar para os quatros lados do mundo que sou feliz...mas não, como você mesmo diz eu desacreditei" na pessoas, no verdadeiro amor...quero saber 0 final de sua história és minha necessidade. vanessamarina_rac@hotmail.com
ResponderExcluirOlá, Vanessa. Confira a segunda parte dessa história no link
ResponderExcluirhttp://cronicasdeprofessor.blogspot.com.br/2013/07/uma-simples-historia-de-amor-parte-ii.html
Essa história é bem real.
Um abraço.